Scans
Imagem dos Bastidores
Transcrição
Good Time estrou na competição de Cannes com Robert Pattinson no filme
sendo: um maníaco, desgrenhado. Quando nos encontramos com ele dois dias
depois, o ator estava com sua figura desajeitada, como ele se define:
magro e pronto para a desarticulação. A sua timidez não é falsa e o seu
nervosismo é expressado por suspiros com calor expressivo. Ele é um
daqueles atores envergonhados pela sua beleza e que duvida das suas
qualidades como ator. Da nossa parte, não duvidamos dele há muito tempo.
O personagem muito físico do filme de Josh e Benny Safdie é outra
metamorfose na sua filmografia cada vez mais e mais rica, ele escolhe
papéis com um gosto óbvio pela novidade. O prêmio de melhor
interpretação seria perfeito para reconhecer este caminho após o sucesso
mundial de Twilight, que o fez uma estrela; e lhe trouxe mais filmes
aventureiros com David Cronenberg, James Gray ou Werner Herzog. Mas
Pattinson não parará por aí. Há High Life de Claire Denis e Idol’s eyes
de Olivier Assayas (irá contracenar com Sylvester Stallone), ele já
anunciou uma colaboração com Ciro Guerra, o diretor colombiano de
Embrace of the Serpent.
Robert faz as primeiras perguntas
Rob: Você se divertiu no festival?
Repórter: Sim, mesmo que os filmes em competição não fossem tão
bons este ano.. Sortudos fomos nós que tivemos um bom tempo assistindo
Good Time!
Rob: Você assistiu outros filmes?
Repórter: The Day After de Hong Sang-Soo
Rob: Oh sim, Claire Denis falou-me desse filme, ela adorou. Tenho de ver.
Repórter: A quinzena de
diretores apresentou um filme muito bom de Claire Denis, L’Amant d’un
jour de Philippe Garrel e Jeannette de Bruno Dumont.
Rob: Jeannette?! Disseram-me que era ruim.
Repórter: Pelo contrário, é brilhante!
Rob: Oh, então tenho de ver.
Agora as perguntas serão feitas pelo jornalista.
Good Time foi um fenômeno em competição.
Sim provavelmente, mas no início o filme não estava em competição. Se o
filme estivesse nas exibições especiais, a recepção do público seria
diferente, seria levado como um filme divertido. Mas é um filme mais
sério.
Você que entrou em contato com os Safdie para trabalhar com eles?
Vi um poster de Heaven Knows What na internet e disse a mim mesmo que se
eles estavam usando aquele tipo de imagem para promover o filme, então a
sensibilidade deles é interessante para mim. O trailer era incrível,
realmente enérgico. Encontrei-me com eles e em questão de segundo soube
que eram bons. É aquele tipo de coisas que se sente. Vi o filme durante
esse primeiro encontro e disse-lhes: 'vamos fazer algo juntos, o que
quer que seja'. Eles têm esta rara qualidade de reagir e tomar decisões
muito rápidas. Normalmente seria: 'okay', e demoraria muito tempo. Com
eles foi 'vamos fazer isso!' e um mês depois recebi a primeira versão do
roteiro. A ideia original para Good Time era muito diferente, eu seria o
irmão de Buddy Duress e tínhamos cursos de interpretação, foi estranho.
Josh Safdie te enviou a biografia do personagem antes de te mandar o roteiro?
Sim, acho que foi antes. É parte do seu processo de escrita. Josh quis
que eu aprendesse aquelas 5, 6 páginas sobre a vida do Connie, o que me
deu a entender que ele foi preso com 12 anos, por exemplo. Senti-me como
um policial aprendendo sobre um prisioneiro. Nada de extremo aconteceu
ao personagem. Soube como ele cresceu, os nomes dos membros da sua
família. Na segunda versão do guião, tive trocas de e-mail constantes
com o Josh e Ronnie Bronstein. Quis ter a certeza de caminhar na direção
certa então contei-lhes sobre a minha ideia de roteiro ideal e eles
sempre me responderam e foram sempre muito 'mentes abertas'.
Demorou muito?
Cerca de 8 meses. Falamos diariamente enquanto eu estive na Colômbia a
gravar The Lost City of Z, porque lá não havia muito para fazer. Isso
fez com que eu investisse no roteiro e me sentisse realmente conectado
com a história.
Desde o início que houve uma mistura entre a impulsividade e os lapsos do tempo.
Sim, é assim que eles trabalham. Acho que a maior parte dos outros
atores não leu o roteiro, à exceção do Buddy, talvez. Cinco minutos
antes da cena começar a rolar, o Josh explicou-a. É louco, nunca tinha
visto isso, esta forma de colocar o set sob pressão, nem entendo como
funciona! Da minha parte, preparei-me convencionalmente para o papel.
Adorei os diálogos, mas Ronnie e Josh estavam prontos para desistir.
Josh podia ter-me dito: 'Adoro a voz que usou nesta cena, vai em frente,
faz o que quiser, agarra o diálogo para ti!' Mas eu queria as palavras
já escritas. Todas as pessoas à minha volta estavam improvisando, então
eu tentei manter-me na linha. Foi um pouco assustador. Quando o teu
parceiro apenas improvisa quando a cena é suposto ir de uma determinada
maneira e tens a certeza que ele ia dizer o oposto do que estava
escrito! Então tive de trabalhar constantemente em intenções, o que foi
excitante.
Trabalhou com algum destes atores antes de chegar ao set, por exemplo com Buddy Diress?
Não. Acho que Buddy estava preso antes do filme ser feito, se bem me
lembro tivemos de atrasar as filmagens porque tivemos de esperar que ele
fosse libertado. A maioria dos atores desempenham papéis próximos da
forma como eles são na vida real. Eles são na sua maioria novaiorquinos e
eu estava com medo de não me encaixar. Foi o meu maior medo durante as
filmagens. Não tinha nada de novaiorquino, todos eles estão olhando para
você para ver se está fingindo. Trabalhamos por tanto tempo que como
consequência, fiquei com o sotaque de Queens enquanto estive lá. Não
veio do papel, mas mais do quotidiano. Tudo se torna mais fácil quando
temos tempo.
O seu personagem está em uma constante metamorfose durante o filme. Algumas destas metamorfoses são ideias suas?
Josh e Benny têm um universo muito preciso, uma espécie de ambiente, e
eu soube que me queria tornar parte disso. Precisei de estar incluído,
precisei de andar nas ruas, interagir com pessoas de fora. Em todas as
minhas outras experiências de set em Nova Iorque, as pessoas
reconheceram-me, como toda a gente pelo mundo fora – os pedestres
queriam tirar fotos minhas. Era um dos meus medos, especialmente ao
trabalhar com atores não profissionais. Acabar me tornado uma
curiosidade para as pessoas à volta. Então começamos a experimentar
roupas e maquiagens, eu ia à rua ver se as pessoas me reconheciam. Um
dia, fomos a uma estação de lavagem de carros à procura de autorização
para gravar, usei essas roupas, tinha manchas na cara, barbar falsa e
consegui ver nos olhos das pessoas que eles não me reconheciam. Usei o
personagem para me esconder.
Connie tenta constantemente se esconder e fugir dele próprio. É como você? Tornou-se um papel pessoal?
Sim, ele é uma espécie de ator sem perceber. Ele também é como um cão
que arranja sua própria causa. É sempre fascinante ver este animal
andando cada vez mais rápido de uma maneira tão obsessiva. Está certo,
há algo realmente pessoal aqui mas não consigo definir o que é. Muitos
elementos foram tirados do filme, havia sequências de sonhos onde o
personagem parecia mais místico... Quando amas isolado dos outros, a
imaginação agarra mais e mais de você e perdes o contato com a
realidade. Falamos sobre isso com Josh, por exemplo na cena em que
Connie está no hospital, ele cruza com um policial e diz-lhe que estava
no quarto com o pai e que há um problema com a televisão... mas para mim
ele não mente: na cabeça dele, aquilo aconteceu. Por um lado, ele
imergiu na realidade mas é constantemente um mundo imaginário. E é algo
que partilho com ele.
O seu gosto pela transformação já estava em The Lost City of Z ou The Rover.
Quando mais se avança na vida, mais sabe sobre que tipo de atitude
despontará esta ou aquela reação, mas usar esse conhecimento em um filme
dá-me sempre a sensação de que estou me repetir, de que estou a ser
sendo. Mas para fazer algo que nunca fiz na vida...Não sei, o que te
estou tentando fazer não faz sentido! É apenas uma maneira de se livrar
de toda a vaidade, todos os 'Eu quero ser bonito'. E se a maioria dos
atores que querem ser transformados, é só porque têm um enorme
sentimento de constrangimento e vergonha deles mesmos. Queremos nos
convencer de que podemos ser alguém, enfrentar melhor a realidade.
Você modestamente faz isso também. No filme de James Gray tens um
papel secundário, assim como em Maps To The Stars. É impressionante!
Interpretei muito papéis pequenos em muitos filmes. Não faz qualquer
diferença. Penso em mim como um aprendiz. Não sei realmente como fazer o
que estou fazendo, estou sempre treinando. Então cada oportunidade de
trabalho é uma lição para mim. E eu não tenho, literalmente, nada a
perder. Por outro lado, há apenas alguns, poucos, bons papéis
principais. A maior parte do tempo, esses papéis estão automaticamente
ligados à promoção comercial. Muitas pessoas estão preocupadas se lhe
dar uma interpretação estranha, mas você é mais livre em um papel
secundário, pode quase fazer o que quiser!
Você falou em lições: o que aprendeu com David Cronenberg?
Cosmopolis foi muito importante para mim. Há Don DeLillo.. quando jovem
ele queria ser músico e o processo de escrita do roteiro de Cosmopolis
foi realmente musical. Antes deste filme, sempre pensei em um papel com
as motivações dos seus personagens. Foi um processo cerebral. Mas em
Cosmopolis, por causa do seu aspeto surrealista, o ritmo de escrita foi
mais importante que as motivações psicológicas. Foi quando aprendi que
podia dizer um monólogo inteiro sem pensar estritamente em psicologia
mas na música escrita no roteiro. David concordou totalmente com aquilo,
não podia simplesmente dizer minhas falas de uma maneira que parecia
boa. Foi mais instintivo, e muito bom. E também aprendi muito ao ver
alguém fazer um filme que no papel parecia impossível.
E com James Gray?
Ao ver o filme, percebi o quanto a interpretação está ligada a
localização da câmara. E daí, o ator não tem de sentir a
responsabilidade de contar a história sozinho... A maior parte do tempo,
no set, tive a impressão de ser um extra. Contudo, trabalhei muito no
meu personagem. Estava sempre perguntando ao James Gray se estava tudo
bem e ele dizia 'sim está'. Mas eu perguntava 'mas não faço nada' e ele
'Você não fez nada, não se preocupe'. Sempre pensei que podia fazer
mais. Mas o personagem surge simplesmente, e para isso tens de confiar
no seu diretor. James Gray tem bom gosto, podemos confiar nele.
Cosmopolis é um papel minimalista, está na maior parte do tempo sentado no carro.
Verdade. Sou o tipo de pessoa mais calma, e com Cosmopolis estava na
minha zona de conforto. Cada filme é uma progressão, e depois de
Cosmopolis disse a mim mesmo que permaneci imóvel. Tornei-me mais à
vontade fisicamente com The Rover para o qual quis realmente fazer algo
com o corpo. Connie também, em Good Time, está à vontade com o seu
corpo. Realmente à vontade!
Tens um método?
Não realmente. Nunca segui lições. Eu reajo muito à escrita. Se alguém
escreve bons diálogos todo o resto segue. Geralmente, tento estar no
personagem muito antes das filmagens. Mas não tenho nenhum outro método
para além de conhecer o meu maior problema, o stress. Isso me impede de
fazer qualquer outra coisa. Com a experiência do drone, entendi que
preciso ir adiante para o set e ficar lá sozinho por um tempo para que o
meu cérebro relaxe... Para Good Time aluguei um pequeno apartamento
durante cerca de dois meses, não muito longe do de Josh. Só precisava de
estar lá para pensar naturalmente sobre o filme a maior parte do tempo e
simplesmente eliminar a tensão.
Você disse que normalmente demora muitos meses se preparar para o papel. Como é a preparação?
Apenas entender como confiar em si próprio. Como quando perde as chaves:
no momento em que as encontras vem um sentimento familiar, 'Ah claro
que as deixei ali!', mesmo que as tenhamos procurado por toda a casa,
procurado em lugares nunca usados ou lugares absurdos. E quando as
encontramos há um momento de reconhecimento. Tentar criar um personagem é
a mesma coisa: procuramos algo em todos os lugares até encontrarmos
esse mesmo sentimento familiar. Há muitas experimentações. Nunca temos
tempo só para uma cena, então tens de fazer antes para estar pronto. E
esquecemo sempre do que estivemos preparando. A outra regra é estar
interessados no que fazemos, sem que nos chateie. De outra forma é
inútil.
Isso é por dentro. Por exemplo, você nunca assiste as cenas que você filmou durante o dia?
Algumas vezes, não sistematicamente. Sabe, sou terrível e chato no
trabalho. Para mim, cada cena é a pior que já fiz na vida. Eu me
rejeito. Lembro-me que durante The Rover, David Michôd me disse 'é tão
mau, vou começar a acreditar em ti'. Sim, esse é o meu processo de
trabalho.
Mas o que te dá a sensação de encontrar um personagem e estar apto para interpretá-lo?
Pode ser o costume. Sou alguém muito tímido, mas às vezes basta dizer
instintivamente algo de uma maneira boa para descobrir que não estamos
envergonhados. E podia trabalhar. Começamos as filmagens de Good Time
com a primeira cena em que estou. Estava incrivelmente nervoso.
Completamente o oposto do Benny que podia entrar no personagem a
qualquer momento e fazê-lo o dia todo! Então eu estava ao extremo, houve
sempre pausas para esta cena. Eu estava fervendo, cheio de adrenalina
(ele imita o seu estado, músculos tensos e hiperventilando) e apenas
disse a mim mesmo 'é isso, vou fazer isto durante todo o filme! Sem
pensamentos, apenas wow!' Até na cena em que estou beijando Taliah
(Webster, que interpreta uma adolescente que o Connie) onde eu deveria
estar relaxado, simplesmente sentado no sofá, eu me colocava nesse
estado. Eu a assustei!
Sobre o que é vai ser o seu personagem em High Life de Claire Denis?
Acontecerá no futuro, o personagem é um astronauta. Ele é um criminoso
que se voluntariou para uma missão em direção a um buraco negro, mas
quando ele está a caminho de lá percebe que um médico quer fazer
experiências sexuais com humanos no espaço. É um filme muito estranho.
Não pensei nisso durante muito tempo, mas Claire falou comigo sobre
isso, aqui em Cannes, e mostrou-me imagens experimentais do espaço, que
eram completamente loucas. Adoro a Claire, mal posso acreditar que vou
trabalhar com ela, e em um projeto de ficção científica. Será lindo.
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