Herança, idealismo, família e destino. O entrelaço entre tantas forças
diferentes é a força-motriz que se centra no coração do major Percy
Fawcett (Charlie Hunnam), figura real e histórica que ganha uma espécie
de cinebiografia com Z: A Cidade Perdida. Com uma trama fundamentada na
complexidade do personagem central, o filme mostra fôlego impressionante
na mão do sempre irretocável James Gray (Os Donos da Noite/2007; Era
uma Vez em Nova York/2013). O resultado é um épico ambicioso no centro
da Amazônia que é, ao mesmo tempo, um longa metragem sobre a forma como o
destino se instala no coração daqueles que ousam persegui-lo.
Filho de uma família tradicional, mas com nome sujo pelas ações do pai,
Percy é alguém que sonha em dar uma vida mais confortável à esposa, Nina
(Sienna Miller). Em busca de condecorações que rendam uma promoção
acima do nível de major, ele aceita viajar para a divisa entre Bolívia e
Brasil e explorar o rio Verde para realizar um estudo topográfico. Após
percalços que incluem insetos, doenças, cobras, onças e índios
“selvagens”, Percy acaba descobrindo sinais de uma civilização ancestral
no coração da Amazônia e acaba dominado por uma ideia-fixa.
Para Percy, pouco importam os jogos de poder ingleses na América do Sul,
ou mesmo a paz que o estudo topográfico influenciaria. Para ele, o
objetivo era provar a existência de uma cultura rica e mais antiga do
que a europeia em meio aos povos selvagens. Dessa forma, o major Fawcett
ia na contramão da noção imperialista que já dominava o mundo de então,
entre as décadas de 1900 e 1920. O que parecia um acinte para parte da
Real Sociedade Geográfica, era uma certeza para Percy. Para ele, os
índios podiam e tinham construído uma sociedade avançada.
Baseado no romance biográfico escrito pelo jornalista David Gran e
adaptado pelo próprio James Gray, o roteiro do filme se divide entre
família e cada uma das três expedições, com uma dissociação grande entre
os ritmos. O resultado é um filme longa, mas que esmiúça as mensagens
transmitidas. O que segura a trama é justamente a complexidade das
motivações do protagonista. Gray filma um personagem que consegue, ao
mesmo tempo, perscrutar o passado e o futuro com sua coragem. Ele
investiga uma história, mirando um além, uma justiça histórica. Ao mesmo
tempo, ele se fia na própria família, que abandona a cada par de anos
para voltar à Amazônia.
Se Charlie Hunnam é eficiente, como de costume, como o protagonista, é
no elenco de apoio que o personagem e o filme crescem. Robert Pattinson,
intérprete do braço-direito de Fawcett Henry Costin, tem uma atuação
impressionantemente precisa. Mais do que aparecer quando chamado, ele
consegue sumir e manter o fluxo de ações. Já Sienna Miller constrói uma
personagem forte, que consegue rivalizar com o forte protagonista. Já
Tom Holland, que surge no final do segundo ato como o filho mais velho
do major, consegue expor a boa dose de antagonismo e contradição de
Percy, algo que ajuda quebrar uma leitura mais maniqueísta sobre o
protagonista.
Centrado na Amazônia brasileira e boliviana, Z: A Cidade Perdida talvez
impressione ainda mais o público nacional. Dimensionada por livros, mas
pouco experimentada pela população, a floresta tropical é apresentada de
forma imersiva e grandiosa. É algo que incita uma exploração, num misto
de fascínio e medo. Z traz em si ainda um respeito imenso pela cultura
indígena, algo que é tratado com pouco caso mesmo no Brasil, e com os
idiomas falados no Brasil e na Bolívia. Soma-se a isso a precisão na
direção de James Gray, que adiciona poesia e iconografia para uma trama
já bem recheada de sentimentos. Ambicioso e grandioso, Z: A Cidade
Perdida é um filme que mostra que nem toda obsessão é destrutiva e nem
todo bem-querer é generoso. É, em suma, amplo como o coração humano.
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