Publicado em:9 de junho de 2017

Cinema com Rapadura: Pattinson atua com firmeza em The Lost City of Z

 A história real de um homem obstinado, que não abriu mão de suas convicções mesmo diante das maiores adversidades, é um belo exercício de cinema de um realizador austero e competente ao extremo.

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James Gray é um diretor ímpar. Seja pela pouca fama que ostenta diante do grande publico, seja pelo pequeno – e apaixonado – séquito seleto de fãs que o acompanham, ele é um notório esquadrinhador do novo. Não que ele se refugie em truques narrativos ou mesmo em formatos extraordinários de vanguarda para demonstrar essa jovialidade profissional. O diretor, que mantém um estilo direto e econômico, utiliza-se quase sempre de ferramentas simples que alguns abominam e outros usam com desdém, transformando histórias despretensiosas em verdadeiras obras de arte. Em Z – A Cidade Perdida, Gray se apropria pela primeira vez de uma narrativa célebre – que automaticamente o coloca como o projeto mais arriscado de sua carreira – e ainda assim consegue manter-se coerente em seus princípios cinematográficos.

Uma característica marcante do profissional, perseguidor unilateral de todos os protagonistas de suas obras, é a expectativa. Se no belo Amantes a espera é pelo amor perfeito, e no triste “Era Uma Vez em Nova York” é por liberdade, em Z, a busca do personagem da vida real é pela glória e reconhecimento. O longa conta a história, baseada em fatos reais, de Percy Fawcet, um oficial do exército britânico que, apesar da alta patente, carrega uma mancha em seu nome, fruto de erros cometidos por seu pai no passado. Desgostoso com sua situação pessoal e familiar, Fawcet aceitou fazer parte de uma comitiva exploratória que tinha o objetivo de arbitrar e demarcar as fronteiras entre o Brasil e a Bolívia na Floresta Amazônica durante os anos 1900. Com a intenção clara de se impor no cenário aristocrático do início do século 20, e de olho em uma condecoração que o elevaria socialmente perante seus iguais, o militar embrenha-se na mata e espiritualmente – no sentido metafórico, não no religioso – nunca mais sai de lá. Mesmo quando volta à terra natal, após cumprir sua missão, Percy se apega à crença de uma civilização perdida no meio da selva, desacreditada por quase todos, e imbui o resto de sua vida nessa busca, importando-se muito pouco com as perdas do caminho.

Em estrutura clássica, com narrativa convencional e fotografia sépia amarelada, quase emulando as fotografias antigas do Fawcet real junto aos indígenas na floresta, Gray coloca toda a carga do filme nas costas de seus personagens. Se Charlie Hunnan não alcança o brilhantismo na interpretação do explorador, tampouco deixa a desejar. É em cima de sua figura que o longa se desenrola. Chega a ser bastante crível a tristeza impetrada em seu rosto na derrota e o brilho obstante em seu olhar, enquanto percorre seu longo caminho ao El Dorado. Robert Pattinson, que surpreendentemente vêm se aprofundando em personas insólitas nos últimos tempos, atua com firmeza e verdade como o companheiro de viagem e alicerce para as aventuras em grupo. Uma inesperada e bem vinda contribuição à história é a personagem Nina Fawcett, desempenhada com paixão pela boa – e subestimada – atriz Sienna Miller. Ela é a esposa abandonada que não se coloca como vítima, mostra força incomum e extrapola suas vontades e determinações como poucas mulheres ousavam fazer naquela época.


Se existe um problema em Z – A Cidade Perdida, ele está enraizado na obsessão com que o diretor deseja evidenciar a fixação de seu protagonista diante de sua legação. Com muitas idas e vindas, a narrativa torna-se truncada e até cansativa em alguns momentos. Fica a sensação de que, mesmo com algumas concessões e omissões na história real do personagem, em detrimento de uma melhor cadência, talvez este poderia ser alçado ao posto de clássico instantâneo. Querendo nos dar todas a armas, ferramentas e fatos, para uma melhor interpretação de um homem tão obstinado como Percy Fawcet, o talentosíssimo James Gray aparentemente compartilha da aflição de seu retratado e se entranha na diligência de seu ofício: a de mostrar seu ponto, sem medir esforços ou consequências. Sejam elas boas ou más.




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