A história real de um homem obstinado, que não abriu mão de suas
convicções mesmo diante das maiores adversidades, é um belo exercício de
cinema de um realizador austero e competente ao extremo.
James Gray é um diretor ímpar. Seja pela pouca fama que ostenta diante
do grande publico, seja pelo pequeno – e apaixonado – séquito seleto de
fãs que o acompanham, ele é um notório esquadrinhador do novo. Não que
ele se refugie em truques narrativos ou mesmo em formatos
extraordinários de vanguarda para demonstrar essa jovialidade
profissional. O diretor, que mantém um estilo direto e econômico,
utiliza-se quase sempre de ferramentas simples que alguns abominam e
outros usam com desdém, transformando histórias despretensiosas em
verdadeiras obras de arte. Em Z – A Cidade Perdida, Gray se apropria
pela primeira vez de uma narrativa célebre – que automaticamente o
coloca como o projeto mais arriscado de sua carreira – e ainda assim
consegue manter-se coerente em seus princípios cinematográficos.
Uma característica marcante do profissional, perseguidor unilateral de
todos os protagonistas de suas obras, é a expectativa. Se no belo
Amantes a espera é pelo amor perfeito, e no triste “Era Uma Vez em Nova
York” é por liberdade, em Z, a busca do personagem da vida real é pela
glória e reconhecimento. O longa conta a história, baseada em fatos
reais, de Percy Fawcet, um oficial do exército britânico que, apesar da
alta patente, carrega uma mancha em seu nome, fruto de erros cometidos
por seu pai no passado. Desgostoso com sua situação pessoal e familiar,
Fawcet aceitou fazer parte de uma comitiva exploratória que tinha o
objetivo de arbitrar e demarcar as fronteiras entre o Brasil e a Bolívia
na Floresta Amazônica durante os anos 1900. Com a intenção clara de se
impor no cenário aristocrático do início do século 20, e de olho em uma
condecoração que o elevaria socialmente perante seus iguais, o militar
embrenha-se na mata e espiritualmente – no sentido metafórico, não no
religioso – nunca mais sai de lá. Mesmo quando volta à terra natal, após
cumprir sua missão, Percy se apega à crença de uma civilização perdida
no meio da selva, desacreditada por quase todos, e imbui o resto de sua
vida nessa busca, importando-se muito pouco com as perdas do caminho.
Em estrutura clássica, com narrativa convencional e fotografia sépia
amarelada, quase emulando as fotografias antigas do Fawcet real junto
aos indígenas na floresta, Gray coloca toda a carga do filme nas costas
de seus personagens. Se Charlie Hunnan não alcança o brilhantismo na
interpretação do explorador, tampouco deixa a desejar. É em cima de sua
figura que o longa se desenrola. Chega a ser bastante crível a tristeza
impetrada em seu rosto na derrota e o brilho obstante em seu olhar,
enquanto percorre seu longo caminho ao El Dorado. Robert Pattinson, que
surpreendentemente vêm se aprofundando em personas insólitas nos últimos
tempos, atua com firmeza e verdade como o companheiro de viagem e
alicerce para as aventuras em grupo. Uma inesperada e bem vinda
contribuição à história é a personagem Nina Fawcett, desempenhada com
paixão pela boa – e subestimada – atriz Sienna Miller. Ela é a esposa
abandonada que não se coloca como vítima, mostra força incomum e
extrapola suas vontades e determinações como poucas mulheres ousavam
fazer naquela época.
Se existe um problema em Z – A Cidade Perdida, ele está enraizado na
obsessão com que o diretor deseja evidenciar a fixação de seu
protagonista diante de sua legação. Com muitas idas e vindas, a
narrativa torna-se truncada e até cansativa em alguns momentos. Fica a
sensação de que, mesmo com algumas concessões e omissões na história
real do personagem, em detrimento de uma melhor cadência, talvez este
poderia ser alçado ao posto de clássico instantâneo. Querendo nos dar
todas a armas, ferramentas e fatos, para uma melhor interpretação de um
homem tão obstinado como Percy Fawcet, o talentosíssimo James Gray
aparentemente compartilha da aflição de seu retratado e se entranha na
diligência de seu ofício: a de mostrar seu ponto, sem medir esforços ou
consequências. Sejam elas boas ou más.
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